3.10.17

Bonsai kitten

Ser a favor do planeamento familiar, isto é, promover a ideia de que cabe às famílias a decisão de quando e como ter filhos (por oposição a um modelo, quase sempre religioso, onde essa decisão fica dependente de outra, a de não usar meios contraceptivos), não significa não reconhecer o impacto que esse tipo de organização social e familiar tem na relação entre pais e filhos. E ele é - foi - tremendo. Essa decisão constituiu o pecado original da parentalidade moderna. As crianças deixaram de ser o resultado esperado e passivo de uma relação conjugal, para passar a ser um projecto fruto de uma decisão planeada. Cada filho passou, por isso, a carregar consigo o potencial de ser um sucesso ou um insucesso dos pais - individualmente e enquanto casal. Em vez dos pais serem a razão de ser dos filhos, foram os filhos que passaram a ser a razão de ser dos pais, o que é, compreensivelmente, uma tragédia. Não surpreende por isso que seja em sociedades onde o nascimento de bebés seja condicionado que esta relação esteja mais deturpada: a mãe-tigre chinesa, que sacrifica tudo em nome do desempenho académico dos filhos, um modelo de educação onde só o que produz resultados objectivos tem valor, onde a independência psicológica da criança é estilhaçada desde cedo para a conformar às guias laterais do trajecto definido pelos pais. Um modelo sinistro que gera adultos depressivos e ansiosos. O desafio do pai contemporâneo de classe média nas sociedades ocidentais é por isso o de conciliar estas duas forças à partida opostas: os filhos como decisão informada mas ao mesmo tempo isolados da ansiedade existencial dos pais.

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